12 junho 2010

Tenho exatos vinte e sete minutos pra escrever a minha carta de suicídio.
Acabei de perder dois minutos analisando a frase acima.
Nunca fui muito bom escrevendo, mas alguns (devo admitir que poucos) amigos sempre me encorajavam a escrever mais, dizendo "Você escreve muito bem, deveria tentar publicar alguma coisa em algum lugar." e eu sempre respondia que tinha um número x de projetos não-acabados e que já tinha começado a escrever alguma coisa. Nunca fio mentira, a quantidade de primeiras frases de um livro que já escrevi dariam para preencher (rá!) um livro.
Ontem, fui buscar os ingressos de um evento ao qual iria amanhã se não fosse morrer nos próximos 19 minutos. E sim, eu escrevo devagar...
Mas voltando ao ao caminho para buscar os ingressos desse evento que acontecerá com ou sem a minha presença, (essa galera da moda tá pouco se fudendo pra quem vive ou morre, desde que esteja bem vestido) o trânsito nesta cidade assustadora estava realmente assustador. E eu tinha que encontrar com um amigo no ateliê/confecção que ele trabalha em Pinheiros, moro e trabalho no bairro Cerqueira César, quase na esquina da Oscar Freire, que estava insuportavelmente lotada de gente chata que acha que entender de moda é 10³ mais importante do que entender de física quântica, não que eu entenda de física quântica, mas porra, é mais importante que a roupa que qualquer um esteja vestindo!
Como o trânsito estava totalmente parado, liguei pro meu amigo cancelando a missão de buscar os malditos convites, idiota decisão, este meu grande amigo me dá a brilhante opção de ir a pé.
Meu tempo já está quase acabando e talvez você queira saber porque me matei.
Caso não consiga concluir esta minha despedida quero que saiba que a culpa não foi sua, nenhum deus tem nada a ver com isso e que eu simplesmente desisti e não senti dor nenhuma que não tivesse sentido pior antes, e que peço desculpas se lhe trouxe algum inconveniente com a minha morte e que não vou me importar com o que for feito do meu corpo quando eu for encontrado, não fique triste e nem celebre, apenas haja como se fosse um dia normal, até porque, é um dia normal.
Depois de andar pra caralho, em um frio para o qual eu não estava preparado (tá bom, algumas roupas são importantes, assim como trajes espaciais) encontrei com meu amigo que estava em uma reunião muito importante que , pra variar, levou mais tempo do que deveria só poderia me encontrar dentro de meia hora e me indicou um boteco pra tomar uma cerveja enquanto esperava por ele, no caminho entre o ateliê/confecção em que esse meu amigo trabalha e o boteco encontrei um bar/balada/estúdio de tatuagem com uma fachada muito legal, entrei só pra conhecer e colocar um piercing na língua, conversei muito com o tatuador, que foi quem fez o furo, e depois de meia hora cheguei no boteco indicado pelo meu amigo que ainda não estava lá e nem tinha idéia que a reunião levaria mais duas horas. Sentei em um daqueles bancos altos encostados no balcão e pedi uma Brahma e uma Salinas, tomei a Salinas em um gole só e virei um dos três copos que vêm dentro de uma garrafa de Brahma.
Depois de uma hora e quarenta e dois minutos esperando meu amigo, um senhor que aparentava ter uns cinqüenta anos passa pelas mesas do bar oferecendo uma folhinha de papel com três poesias e um conto pequeno, minha simpatia sempre me fez perder tempo conversando com desconhecidos, o bar estava cheio, é difícil algum lugar não ficar cheio aqui em São Paulo, e ele precisava vender mais e eu queria beber em paz mas curtiria conversar com alguém. Ele me ofereceu a folhinha de papel bem gasta pelo tempo e eu lhe fui sincero, disse que não gostava de poesia, e retrucou dizendo que a poesia gostava de mim, ri da piada infame e perguntei quem havia escrito e ele disse que era o autor e já tinha dois livros publicados de forma independente e que uma editora pequena vai publicá-lo ainda este ano. É sério.
O trem do metrô já tá chegando e eu tenho que pular na frente dele.
Foi bom ter conhecido você.